Notícias

Projeto ajuda crianças e adolescentes a voltarem para a escola na Serra, ES

27/01/2022 | - |

Objetivo do projeto Território em Rede é fazer uma busca ativa pelos bairros da cidade para encontrar crianças e adolescentes que estejam fora da escola ou em risco de evasão. A partir daí, tem início um processo de articulação em rede para ajudar as famílias e garantir o acesso à educação.


Por Maíra Mendonça, G1 ES em 08/07/2021 21h44 Atualizado há 7 meses

Aos nove anos de idade, José Aldo Oliveira experimentou, pela primeira vez, como é a sensação de frequentar uma instituição de ensino. É na Escola de Ensino Fundamental Professora Anna Gomes que o menino, morador do bairro Santa Rita de Cássia, na Serra, na Grande Vitória, está aprendendo a ler e a escrever.

A chegada de José Aldo até a sala de aula foi conduzida pela assistente social Patrícia Helena Lamas Lemos, que atua como articuladora em um projeto que vem sendo desenvolvido na Serra desde janeiro deste ano justamente com o propósito de estabelecer ou restabelecer vínculos entre alunos e escolas.

Em pouco mais de seis meses de funcionamento, o Território em Rede já acompanha cerca de mil crianças e adolescentes entre quatro e 17 anos, todos moradores da Serra.

“Temos uma equipe formada por 10 pessoas. Oito delas são articuladoras, que circulam nos bairros da Serra para identificar crianças e adolescentes fora da escola ou em risco de evasão escolar. Na pandemia teve muito a questão da perda do vínculo escolar. A partir daí, nós fazemos um cadastro e passamos a acompanhar as famílias”, explicou Roberta Batista Verneque, que é gestora do Território em Rede no município.

Mas garantir o retorno dos alunos para a escola vai muito além da efetivação da matrícula e passa, principalmente, pela identificação das necessidades de cada família e da adoção de medidas para resolver esses problemas.

Por isso, a ideia do projeto, que é uma iniciativa da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) Cidade Escola Aprendiz junto à Fundação Vale, é criar uma rede de articulação, de modo que todos os serviços assistenciais da cidade e também de outras organizações não governamentais sejam acionados em prol das famílias que necessitam de apoio.

E as necessidades são muitas, como pontuou Roberta.

“São questões de vulnerabilidade social. Às vezes a criança não vai para escola porque não há vaga em uma escola mais próxima e o pai precisaria pagar um transporte, mas não tem dinheiro. Acontece também de a criança ter uma doença não diagnosticada e não ter passado por atendimento médico. A insegurança alimentar também é um grande problema, que aumentou muito durante a pandemia”, elencou a gestora.

Já Patrícia, que todos os dias sai das 8h às 14h pelas ruas da Serra para bater de porta em porta em busca dessas crianças, lembrou-se de outras barreiras muito frequentes.

“As vezes falta um documento, falta informação. Os pais precisam de ajuda para fazer, por exemplo, o Cadastro Único, para se inscreverem no programa Bolsa Família”, disse.

A falta de documentação era justamente o que afastava José Aldo da escola. Sua mãe, Adna Mateus Oliveira, de 36 anos, conta que quando o menino nasceu, ela perdeu a certidão que atestava que ele havia nascido vivo junto a outros documentos. Informada pelo hospital de que teria que fazer o registro do filho por vias judiciais, Alda acabou não registrando a criança. Por anos, teve medo de contar a situação e de pedir ajuda.

“Eu tinha medo de que tirassem meu filho de mim, entende? Até que a Patrícia chegou aqui no bairro, conversou com várias famílias e veio falar comigo. No começo eu fiquei com um pouco de desconfiança, tratei ela até um pouco mal, mas hoje eu falo que ela é um anjo na minha vida. Ela me ajudou, correu atrás de tudo”, contou Adna.

Com a intervenção da articuladora, a família conseguiu registrar José Aldo. E, para além de ir para a escola, o menino pôde segurar em suas mãos, pela primeira vez, a sua certidão de nascimento, que chegou no dia 1º de junho.

“Para mim, do meu coração, é um privilégio ver ele estudando. Ele conta as horas para ir para a escola. Eu quero que ele seja uma pessoa na vida, que dê orgulho pra mim. O que eu não tive, eu quero que ele tenha. O que eu quero é ver meu filho estudando”, contou a mãe.

Adna Mateus Oliveira segurando a certidão de nascimento do filho, José Aldo Oliveira, de nove anos — Foto: Divulgação
Adna Mateus Oliveira segurando a certidão de nascimento do filho, José Aldo Oliveira, de nove anos

Desafios na pandemia

O desafio de fazer com que crianças e adolescentes retomem o vínculo com o ambiente escolar ganhou uma dimensão maior no contexto da pandemia.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostra que em outubro de 2020, mais de 1,3 milhão de estudantes de 6 a 17 anos não frequentavam a escola no Brasil, um percentual equivalente a 3,8% do total de estudantes nessa faixa etária.

Somam-se eles outros mais de 4,1 milhões, que afirmaram frequentar a escola, mas que não tiveram acesso às atividades escolares e não estavam em férias.

Este foi um dos motivos pelos quais o projeto Territórios em Rede, que já estava sendo aplicado na cidade de Marabá, no Pará, fosse trazido para a Serra.

“Em muitas casas não há internet, celular ou computador para as crianças estudarem. Mas ainda assim as escolas mandam atividades impressas. Só que por falta de informação, muitas famílias nem sabem disso. Então, nosso trabalho é ajudar”, contou Patrícia.

Aqui no estado, o trabalho deverá ser feito ao longo de 30 meses. Durante esse tempo, os articuladores continuarão indo de bairro em bairro em busca de vidas a serem transformadas por meio da educação.

Esta é a chamada busca ativa. Mas a identificação das crianças também vem sendo feita com o apoio da Secretaria de Educação da Serra, que envia listas com nomes de estudantes que estão afastados ou com problema de frequência escolar. O diálogo entre as instituições também facilita a disponibilização de vagas mais próximas aos lugares onde os estudantes moram.

“É fundamental que a gente possa desenvolver iniciativas e políticas que trabalhem essa questão da busca ativa escolar e que possam criar as condições necessárias para que essas crianças, adolescentes e jovens que estão em situação de vulnerabilidade social sejam amparados e tenham o direito garantido”, afirmou Natacha Costa, diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz.

As plataformas da Cidade Escola Aprendiz utilizam cookies e tecnologias semelhantes, como explicado em nossa Política de Privacidade, para recomendar conteúdo e publicidade.
Ao navegar por nosso conteúdo, o usuário aceita tais condições.